Projeto de lei em regime de urgência
Paulo Metri
Um
deputado de esquerda apresenta o projeto de lei que visa retirar dos médicos a “escolha
de Sofia” de quem ganha um respirador na fase mais grave do ataque do
coronavírus e, assim, passa a ter maior probabilidade de viver, e quem não
ganha.
Este
projeto está sendo esperado por todos os deputados, tendo sido acordado que ele
com suas eventuais emendas serão aprovados no mesmo dia. A votação unânime de
lideranças e a presença mínima conseguida através de videoconferência e mais
algumas presenças físicas garantem a legitimidade do processo legislativo.
O
autor do projeto argumenta que, o princípio usado pelos médicos até o momento
de sempre ganhar o doente mais jovem, pois pouco viveu, não necessariamente é
justo. Por exemplo, se for comparado um bandido jovem, autor de vários assassinatos,
e um religioso que dedicou a sua vida a obras sociais, o mais jovem não é uma
boa opção.
No
projeto, recebe o respirador o doente que tiver o melhor “currículo social”, no
qual são considerados nobres os profissionais das áreas da saúde, do ensino e da
pesquisa, os servidores públicos e aqueles que exercem atividades de
contribuição social.
Neste
instante, ouve-se a voz de um congressista do plenário.
-
Este projeto de Vossa Excelência é extremamente meritório e importante, porque
resolve uma questão crucial, neste momento de calamidade. No entanto, eu
gostaria de sugerir um adendo, que é a inclusão de um artigo que proíbe os
“negacionistas” de receberem respiradores, uma vez que, ao negarem a gravidade
da crise, ao negarem a possível falta futura deste equipamento, eles
dificultaram a sociedade de se preparar para o combate à esperada escassez
deles.
Outra
voz ecoa vindo da tela dos “presentes” graças ao vídeo.
-
Tenho dúvida se há necessidade deste projeto. Contudo, como ele pode vir a ser
aprovado, devo propor, agora, a correção de uma injustiça contida nele.
Contribuem socialmente, também, os empreendedores, os empresários, que criam os
empregos.
O
presidente da sessão, querendo impor a ordem, passa a palavra para o primeiro
inscrito. Até então, tinha a palavra quem fosse mais ágil.
-
Desejo saber como se vai ter o “currículo social” a tempo da tomada de decisão.
O vírus não espera.
-
O próprio médico pode fazer perguntas sobre o paciente aos seus familiares e
amigos ou podem ser usados os dados do levantamento que a “Inteligência” do
Executivo vem fazendo das lideranças da nossa sociedade, há algum tempo. Mas, é
preciso interpretar este levantamento com outra ótica, ou seja, uma pessoa com
compromissos sociais não é uma ameaça à sociedade. Aliás, ela é benéfica à
sociedade.
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Tenha a palavra, o segundo escrito, Excelentíssimo Deputado do recém-criado
partido.
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Grato. Quero concentrar minha intervenção na valorização da geração de
empregos, já mencionada. Têm-se má distribuição de renda. Pois uma maior
geração de empregos contribui para a melhoria desta distribuição. O combate à
fome é desejado e os empregos também a combatem. Assim, quem mais tem
capacidade de gerar empregos, maior contribuição dá à sociedade. E quem tem
maior capacidade de gerar empregos é quem tem maior património.
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Agora, pela ordem de inscrição, tenha a palavra Excelentíssimo Pastor.
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Estamos aqui buscando salvar os melhores da nossa população, tarefa que só
poderia ser bem executada por Deus. Assim, estamos tendo a pretensão de
substituir Deus. Quem somos nós, além de reles pecadores? Mas, temos uma
questão prática, que é a escolha dos critérios de quem vive e quem morre. Proponho
que entreguemos a questão de volta ao Divino, bastando perguntar aos doentes:
“Você tem fé?” ou “Você acredita que Deus existe?” ou “Você professa alguma
religião?” Merecedores dos respiradores são aqueles que têm fé.
Neste
momento, um Deputado da região Norte manda este whatsapp para seu colega de São
Paulo: “Estou aqui fazendo número porque o Presidente da Casa pediu muito que
participasse desta videoconferência. Hoje, vejo o acerto que fizemos ao aceitar
as contribuições dos donos de capital para nossas campanhas. Pensei que eles
ajudariam só na eleição. Mas eles nos ajudam e às nossas famílias a viver. Não
será o caso, se Deus quiser, mas se o pior acontecer, já soube que temos
respiradores garantidos.”
21/05/2020
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