Petróleo: bênção ou praga?
Paulo Metri
O cidadão comum conhece pouco as atividades das empresas petrolíferas estrangeiras. Sabe que elas atuam em atividades de toda a cadeia do petróleo, ajudando o desenvolvimento nacional ao gerarem emprego e renda. No entanto, é preciso analisar em detalhe para formar uma opinião bem fundamentada.
Para começar a analise, sugiro que os leitores assistam aos quatro vídeos realizados pelo canal de televisão RTP, intitulado “O Segredo das Sete Irmãs - a Vergonhosa História do Petróleo”. Atualmente, estão disponibilizados na internet, em inglês e legendado para português, no endereço: https://nossofuturoroubado.com.br/o-segredo-das-sete-irmas/
Argumentam que os
vídeos são antigos e as empresas mudaram suas posturas. É verdade, mas é bom
sabermos o que elas fizeram no passado no mundo. Trata-se de conhecer as suas
heranças genéticas. As grandes petrolíferas que atuam no Brasil são basicamente
as estrangeiras e a Petrobras. Todas elas sentem-se atraídas por atividades com
altos lucros, que podem ser blocos de petróleo e gás no Brasil. Contudo, algumas
empresas estrangeiras podem não ter perdido a característica da pronta disposição
de praticar ilicitudes, desde que os lucros aumentem, como a compra de apoio
político, fraudes contábeis e outras, práticas impensáveis para a Petrobras.
Também, pergunta-se
se não há certa permissividade no conceito do que é licito. Por exemplo, “a apropriação do excedente econômico de
atividades lícitas muito lucrativas, totalmente pelo dono do capital, é
correto?”. Assim, exclui-se a possibilidade de forte taxação da atividade
pelo Estado para uso em gastos sociais.
O mercado do
petróleo, assim como o do ouro, é muito lucrativo, justificando o petróleo ser
chamado de ouro negro. Sobre o Pré-Sal, cuja reserva ainda não é completamente conhecida,
pode-se dizer ser uma riqueza imensa, ou seja, mais de 200 bilhões de barris de
petróleo, em um mundo que precisará desta riqueza durante os próximos 50 anos.
A história do
petróleo no Brasil, assim como em outras regiões do planeta, como visto nos
videos, é cheia de lutas, vitórias e fracassos. Desde os anos 40 do século
passado, heróis brasileiros visionários argumentavam que, graças à extensão do
território nacional, seria difícil o Brasil não possuir petróleo. Por isso, lutaram
por um modelo de organização do setor que garantisse que boa parte da receita
obtida graças à atividade petrolífera fosse disponibilizada para a sociedade brasileira.
Para a escolha do
modelo de organização do setor, patriotas mobilizaram nossa sociedade a ponto
de promover o maior movimento de massas do país, levando-se em conta para a
comparação, as características da época. É impossível listar todas as
lideranças deste movimento, mas pode-se dizer que o general Julio Caetano Horta
Barbosa representa os incansáveis lutadores desta causa. Este movimento foi chamado
de a campanha do “Petróleo é nosso”, que resultou na aprovação da Lei 2004 em
1953, que estabelecia o Monopólio Estatal do Petróleo.
A partir daí, o
capital estrangeiro tentou insistentemente quebrar este monopólio, sem sucesso,
enquanto a chama da campanha gloriosa ainda povoava o sentimento popular. Veio
a elaboração da Constituição de 1988, que resultou em um texto muito bom,
graças aos constituintes eleitos pouco depois do termino da ditadura, escolhidos
com cuidado redobrado e de um universo de candidatos renovado. O monopólio
estatal do petróleo foi incluído nesta Constituição. Nos primeiros anos, o
lucro da atividade petrolífera foi destinado à construção de obras de infra-instrutura
do setor, que está sendo destruído pelo atual governo neoliberal.
O que sempre esteve
em jogo nesta briga pelo petróleo nacional, inclusive continuará em jogo,
enquanto o Brasil tiver reservas razoáveis e um povo não politizado, é principalmente,
a apropriação do excedente econômico do setor, que é um dos mais rentáveis. Também,
o pais que tiver muitas reservas terá grande poder geopolítico. Além disso,
como os investimos do setor são altos e diversificados, pode-se utilizá-los
como uma alavanca para o desenvolvimento do país. Isto tudo é o que será
perdido se os contratos forem entregues a empresas estrangeiras.
Em 1994, Fernando
Henrique Cardoso (FHC) chegou à Presidência, com forte apoio da mídia e tendo
mudado muitas das suas posições políticas antigas. Nesta época, a mídia tinha maior
influência nas eleições do que em anos anteriores. O artigo 177 que,
anteriormente, garantia o monopólio, com a Emenda Constitucional 9 de 1995,
proposta por FHC, na prática, quebrou o monopólio estatal. Pode-se dizer que esta
foi a primeira grande abocanhada do setor petrolífero internacional ao nosso
petróleo. Houve reação, principalmente, a do então Governador do Paraná,
Roberto Requião, que apresentou ao STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) desta Emenda e da Lei 9.478 dela resultante.
Após o voto do
Ministro Eros Grau no julgamento, alguns Ministros do STF o acompanharam,
derrubando esta ADI. O Ministro Grau, em seu voto, garantiu o monopólio do
petróleo do Brasil, enquanto ele estivesse no subsolo. Deixou que empresas
estatais e privadas pudessem retirá-lo do subsolo, sendo elas remuneradas para
tal atividade. Porém, a lei 9.478 entregava o petróleo produzido para pagar a
retirada dele do subsolo, quando esta retirada custa bem abaixo do valor do
petróleo retirado. Assim, nasceram os contratos de concessão.
A partir daí,
ocorreram inúmeras rodadas de licitações de petróleo ganhadas por empresas
estrangeiras, com contratos leoninos para a Petrobras e para nossa sociedade.
Por exemplo, por estes contratos, o Brasil não fica com nenhuma gota do seu
próprio petróleo. Outro exemplo, o abastecimento de petróleo ao Brasil é
garantido por somente 30 dias, não importando a época.
Em 2006, durante o
governo Lula, um grupo de geólogos da Petrobras tendo o geólogo Guilherme
Estrella na coordenação do grupo, descobriu o Pré-Sal, a maior província
petrolífera descoberta, então, nos últimos 30 anos. Como as reservas dos campos
desta região eram razoáveis, o custo de extração tendia a ser baixo e era um
petróleo de boa qualidade, podia-se pensar em contratos de exploração e
produção mais benéficos para a sociedade brasileira e para a Petrobras. Assim,
os contratos de partilha da produção foram desenvolvidos, para a área do
Pré-Sal, com a preocupação de canalizar recursos para as áreas de saúde e
educação.
Infelizmente, já no
governo neoliberal de Temer, a bancada entreguista colocou projetos de
desvirtuação dos contratos de partilha. Exemplos: a Petrobras não seria mais a
operadora única do Pré-Sal, a Petrobras não teria mais 30% de cada consorcio
firmado no Pré-Sal e, por ai, vai. Esta bancada aprovou também o projeto de
Temer de isentar as empresas petrolíferas de todos os impostos federais por 30
anos, isenção esta calculada em R$ 1 trilhão. Notar que foi usada a tática de
não derrubar o contrato de partilha e, sim, “aperfeiçoá-lo”. Esta está sendo a
segunda grande abocanhada do nosso petróleo.
Para concluir o
butim contra a sociedade brasileira, fomos obrigados a honrar a palavra de um
ministro brasileiro que prometeu proporcionar dividendos maravilhosos a
investidores estrangeiros, que foram aproveitados também por brasileiros. Dividendos
estes alimentados pela política irracional de preços dos derivados de paridade
internacional, e pela venda de ativos a preços vis.
Com empresas estrangeiras, como estas, e políticos entreguistas como muitos dos nossos, o Brasil não precisa de forças armadas estrangeiras nos invadindo para sacar o nosso petróleo.
04/08/2022
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